O GRITO NA EDUCAÇÃO
Quando a educação não faz mais
nenhum sentido e não possui qualquer propósito o disciplinamento torna-se a
única razão da escola. Quem não educa para a liberdade necessita subordinar e
adestrar para a obediência.
Na antiga Grécia o pedagogo era
aquele que conduzia o aluno à escola. Hoje, levada para dentro da escola, a
pedagoga é, via de regra, aquela que conduz o aluno para o lugar nenhum. Sem
horizonte, sem fins, sem perspectivas, o seu cadáver adiado reproduz as horas e
as regras e assim a ampulheta da vida é virada todos os dias, garantindo a
ordem conveniente do enfadonho ambiente escolar.
Onde não há prazer em aprender,
onde não há interesse em descobrir o mundo, onde não há espaço para a reflexão
e o debate sobre as verdades estabelecidas, também não há lugar para o
desenvolvimento do intelecto ou para a evolução do conhecimento. Ambiente
desagradável, o modelo da escola passa a ser o exército, esfera onde não há
possibilidade para questionamentos, para o prazer de fazer e criar; espaço do
não pode isso, do não deve aquilo, do não pode nem deve aquilo outro. Marcha
aluninho cabeça de papel, quem não marchar direito...
Refém de uma pedagogia da regra,
da ordem, da punição e do grito, a satisfação da pedagoga se assemelha à do
tirano abandonado que tenta nos atos mais imbecis testar sua capacidade de
distribuir castigos e recompensas e causar mal-estar a seus súditos infiéis. A
pedagogia do grito não se importa com o desenvolvimento do processo criativo,
não se interessa com o aprender a aprender, sua preocupação é a domesticação, a
ordem, as regras... Quanto mais regras e normas mais possibilidades punitivas e
maior controle.
Mais regras, mais castigos, mais
crimes; na falta de uma doutrina ou filosofia moral, diante da ausência de
justificativa ética, o ato de penitenciar ou de tentar impor qualquer punição
que leve a algum arrependimento por algum erro ou falta cometida, nada mais é
do que sadismo, vingança truculenta e descontrole. Mas para deleite da pedagoga,
a escola exacerbada por seu lado de penitenciária e ainda premiada por seu lado
de prisão, com seu ambiente irresistivelmente agradável formado por grandes
portões e grades por todos os lados, é o ambiente propício para se impor
regras, para obter controle e submissão.
Fruto da mediocridade a pedagoga
quer uniformizar... Ela, coitada, não sabe que o novo conhecimento nasce da
experimentação, de tentativas e erros, de uma busca que só pode nascer com a
insatisfação, com a negação do pré-estabelecido. A pobre pedagoga desconhece
aquilo que é óbvio e ainda se acha na condição e no direito de julgar[1], de apontar o dedo, de culpar e atribuir
responsabilidades; pior num ato que imagina ser educar se coloca como
comandante em chefe na condição de conduzir a tropa, mesmo que em direção a
caminho nenhum.
Mas qual é a sua culpa? É óbvio
que a pedagoga é também vítima da sua má formação, afinal ninguém com o mínimo
de desenvolvimento de sua capacidade cognitiva se sujeitaria, de bom grado e de
modo consciente, a desempenhar papel tão ridículo; afinal, se para as crianças
a figura de megera ainda é capaz de causar medo e repugnância, para o cruel
senso de justiça dos adolescentes ela vai se tornando grotesca ou patética e a
mulherzinha de cara amarrada não deixa de ser vista como a histérica mal amada
ou a tiazinha mal comida e ainda assim indigna de piedade.
Sejamos mais complacentes afinal
só pode ser taxada de vítima quem, após alguns semestres num curso de
pedagogia, abandona seus sonhos de educadora, para ser carcereira de
adolescentes. O seu grito, portanto, talvez seja o recurso da derrotada diante
do seu destino: o maior castigo ao cadáver insepulto da pedagoga.
[1] Pedagogo. [Do grego paedagogu]. 3. Fam. Aquele que se julga com o direito de censurar o outro. In. Novo
Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2005. Pg. 1290.
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