Paralelismo
semântico
Quando se coordenam palavras, é importante que elas pertençam à
mesma área de significação. Caso isso não ocorra, pode haver uma
ruptura do paralelismo. Esse tipo de quebra produz muitas vezes
correspondências indevidas, como neste exemplo:
“A diferença entre o IDH dos países pobres e os
países ricos é resultado sobretudo da educação.”
O aluno se propõe a estabelecer o contraste entre dois IDH´s
(Índices de Desenvolvimento Humano). Para isso inicia um processo
coordenativo em que o primeiro termo é a sigla seguida de um adjunto
adnominal. Espera-se que no segundo ele mantenha o mesmo
padrão, falando do IDH dos países ricos.
Como isso não ocorre, o resultado é um confronto entre elementos
heterogêneos. Não se pode comparar um índice com um país.
Outro exemplo aparece nesta passagem de uma redação sobre os
desafios de quem chega à cidade grande:
“Armadilhas, tentações, interesseiros irão lhe
acompanhar aonde você queira ir.”
Embora os três núcleos do sujeito estejam representados por
substantivos (ou seja, não há quebra do paralelismo
morfossintático), é visível a ruptura produzida pelo terceiro. Os
dois primeiros são genéricos, remetem às ações, enquanto que o
último designa o agente. Para haver harmonia semântica, o aluno
deveria ter escrito “interesses” em vez de “interesseiros”.
Exemplo semelhante ocorre neste outro trecho:
“A partir de então, na empresa, foi vítima do ciúme, do
ressentimento, dos agressores que a invejavam.”
Se o redator inicia a sequência de complementos com “ciúme” e
“ressentimento”, é natural que a feche com uma palavra do mesmo
nível semântico. Escrevendo, por exemplo, “da agressividade
dos que a invejavam”.
Às vezes a ruptura é discreta, mas nem por isso deixa de
comprometer a unidade do período. Muitos talvez não percebam que
ela ocorre no exemplo abaixo:
“O dinamismo econômico dita a capacitação profissional e
os serviços mais qualificados.”
Mas ocorre, sim. A frase ficaria mais harmoniosa caso os dois
complementos fossem da mesma natureza, o que se obtém com uma
pequena inversão dos termos que formam o segundo objeto direto: “O
dinamismo econômico dita a capacitação profissional
e a maior qualificação dos serviços.”
A quebra do paralelismo pode ter caráter estilístico, como nesta
famosa passagem de Machado de Assis:
A menção ao dinheiro surpreende o leitor, que espera a continuidade
da indicação temporal. Ao coordenar informações que não têm
relação uma com a outra, o narrador enfatiza que a moça não
esteve com ele por amor; agiu por interesse. Outro seria o efeito se
essa confissão aparecesse em outro contexto. Seria uma referência
crítica e talvez nostálgica, mas a que faltaria a nota irônica.
Chico
Viana é professor de português e redação. www.chicoviana.com
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